Tenho tanta saudade de mim...

segunda-feira, maio 26, 2014

opostos

fui da guerra
você, da paz
fugi de nós
você, jamais
estamos sós
com você, não mais
desatei os nós
rezei ritos finais
o nosso amor
cruzou vendavais
navegou em mares
à deriva, sem sinais
por fim descansou
ou se afundou num cais
eu que sempre fui ondas
você, meus sais
hoje estou em terra plana
aleijado-louco-incapaz

domingo, maio 18, 2014

Meu Deserto

Homenagem a meu pai que me abraça à vezes menino.

Por cima da porteira velha
Se vê um casarão, outrora majestoso,
Hoje tapera...
No terreiro de chão batido e de pedra
Corria menino com bola,
Jogava-se pião e peteca.
Às sombras da barba de bode
Que vence o tempo valente
Jazem recordações que em mim
Embaçam e nublam a mente.

A fazenda triste e sozinha,
Com a casa de varanda farta
De beirais, alpendre e cozinha
Erguida nos idos de 45,
Ecoa o silêncio de velhos
Que ali cumpriam a sina
De contar estórias da era
Que vaqueirar era profissão de respeito
De homem destemido e direito
Que é sério e não fala balela
É reto e jamais erra o passo
São coisas que nunca me esqueço
Como o véi Zé Pereira e seu cangaço.

O tempo foi em parte cruel
Levou meus heróis de criança
Meu pai, minha mãe, o Itamar
Que hoje me dói na lembrança.
Às vezes os busco de novo
Indefeso, gritando socorro
Nos resquícios de suas passagens
Neste mundo que lhes foi pouco.

Aquela casa – tapera caída
Cujo passado a poeira invade
Guarda num canto escondido
As letras de um velho sem idade
Que assina Hiran Guará, meu filho
Dizendo: “Meu Deserto, que saudade”.

E marejam os olhos sofridos
Deste homem e também do menino.
Sabia que até ali fora justo
No caminho que vinha seguindo.
E cerra por fim a porteira
Deixando a velha fazenda
Leva, porém, uma nesga do tempo
(sem virar o rosto decerto)
Em que ali fora oásis,
Hoje de fato um deserto.

a culpa é da tatuagem

Foi aquela tatuagem. Nas outras vezes sempre sabíamos que era fase e depois que os ânimos se acalmassem nós nos teríamos de novo. As outras eram bobagens, tinham um motivo real, orgânico, fácil de tratar. Esta não.

Nossa vida era uma linha reta, segura, constante. Púnhamos a velocidade que queríamos sem medo de capotar. O fato é que neste fluxo, corríamos o risco das estradas confortáveis: cairmos no sono. Talvez por isso quando um adormecia, o outro tomava um caminho sinuoso, com perigos iminentes, turbinava-se de adrenalina, pra depois correr a mil, juntos, na pista segura de ambos, em nossa autoestrada.

O problema agora não eram as curvas, os abismos e as serras. Deu pane no motor. Perda total? Cadê nosso reboque?

Antes mesmo de verbalizarmos um fim, veio ela serpentinada e azul, beijando aquela pele que me pertenceu. Nela eu sim me tatuei com saliva e com amor antes. A saliva decerto evaporara e o amor ficara ali? Será por isso esta ousadia? Cobrir o que desenhei por anos com desejo, afeto e aflições? Não era justo, não é justo. Foi aí que entendi que era definitivo.

Não sigo mais estradas, corro atalhos fugindo de ti, mas sempre te encontro no final. Sempre. O caminho que era tão certo, hoje não tem sentido. Perdi o mapa, a direção. Estar só dói. Literalmente. Humanamente. Visceralmente.

Os braços que envolvo, as bocas que beijo, as estórias que ouço, tudo fala de ti. Sei bem que no fundo tu quem é o roteirista e o diretor. Que estás ali, cruel, escondido detrás daquela janela vigiando esta cena que atuo. Deixando a tua marca. Escrevendo sobre mim o que sei e o que ainda queria ter sabido de ti. Dirigindo a tragédia de minhas noites vazias. Invadindo meus sonhos intranquilos. Aniquilando a esperança de te rever.

Afinal de contas, me fala! Já busquei em tudo. Google. Pai-de-santo. Maculelês. Salamandras. Padre Quevedo. Deus. Não consigo entender. Que raio significa esta maldita flor azul de tua perna?

terça-feira, maio 06, 2014

Jaz em mim

Não sou céu
Não sou seu
Sou Morfeu
Fecho o teu
Olho mel,
Camafeu.
Meu Romeu
De sonhos mil
Nasceu viril
Findou em abril.
E afinal
Sumiu?
Nunca!
Em mim jazeu.