Tenho tanta saudade de mim...

domingo, fevereiro 26, 2012

Saudade de mim


Damos-lhe apenas nomes. A humanidade tem experimentado os mesmos sentimentos desde toda sua existência: as mesmas taras, os mesmos medos, as ambições, tragédias, gozos e as mesmas afecções psíquicas. O que mudou é que os classificamos, categorizamos e sistematizamos ao longo do tempo. Temos-lhes atribuídos diagnósticos e terapêuticas. Isto se deve ao fato de atualmente vivenciarmos o melhor entendimento do homem pelo homem; o que filósofos gregos, grandes pensadores, renascentistas e demais mentes brilhantes postulavam sobre o funcionamento orgânico do homem e sua interação com o entorno, agora é de real conhecimento as suas fórmulas químicas, seus espectros de ação, seus receptores coadjuvantes e seus desencadeamentos fisicoeletroquímicos, ao que vulgarmente chamamos de sentir.

Nesta constatação quase primaz, tem-se a sensação da autossuficiência; que o homem é in totum o senhor de si e que suas interações moleculares são suficientes para o entendimento da postura humana ante eventos satisfatórios ou trágicos. Ousa-se ainda afirmar que este conhecimento enfrenta inclusive as barreiras que limitavam o homem físico da sua existência sobrenatural: é como se nomina o poder noético da ciência contemporânea.

Infelizmente, o que é inevitável é o contínuo desassossego do ser, mesmo este sendo possuidor da sabedoria suprema de si, fazendo persistir a vivência dos mesmos desejos, aflições e prazeres de outrora. E nesta hermenêutica da construção da consciência humana (mesmo que esta ocorra quase que inconscientemente), o homem sempre se esbarrará nos pilares da sua formação, fincados sob a égide do “se”. Como se a existência e a evolução da vida fossem detentoras da dualidade de escolhas, de dois caminhos distintos que, em marcos históricos, fosse-se determinado qual estrada percorrer, culminando no que somos hoje. Ora, ao se analisar o que nos tornamos, é óbvio e categórico afirmar que há apenas um único caminho! Somos produtos daquilo que todas as sociedades sonharam e continuam a sonhar, talvez o tempo (a cronologia em si) fosse distinto segundo as escolhas tomadas, mas o destino seria um só: a liberdade.

Tentarmos ser livres é o que tem pautado a nossa existência: livres de pensamentos fundamentalistas, de imposições sociopolíticas ou mesmo de barreiras impostas por nós próprios. A verdade é que esta liberdade plena é ainda tão distante qual fora no passado. E é por isso que agora percorro esta linha tênue que separa a loucura da sanidade imbuído de um espírito inquieto e desbravador, mesmo com a visão turva e a mente obnubilada. É que já nasci fadado a deter este desejo que me parece inatingível e por isso me arrebenta o peito uma dor tão grande e asfixiante como se fora saudade, como se fora saudade de mim.

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